TOP 10 argumentos ruins em defesa de PDF



|  Por Clara Taveira  |

Antes de mais nada, deixo bem claro que não estou me referindo aos leitores de PDF que realmente não podem pagar. Pessoas pobres de verdade, sem incentivo a leitura por parte da família, escola, governo, enfim. Não vou entrar nesse aspecto nesse texto. Tudo dito aqui é uma crítica a quem vai para NY todo ano, ou gasta meio salário mínimo no salão de beleza, troca de carro toda hora, enfim, tem como pagar R$ 10,00, mas prefere baixar o PDF e justificar com argumentos meia-bomba. Não se ofendam com pouco, nem tentem levantar a bandeira socialista cultural aqui, ok? :)

A crítica também não inclui pessoas que recebem PDF do autor ou da editora, não inclui blogueiros e seus motivos (que não sei quais são) para consumir PDF, nem inclui pessoas que meio que usam o PDF de “consignação”: lê para ver se vale a pena comprar.

Vamos enfatizar, só para ninguém brigar:

A CRÍTICA NÃO É PARA QUEM NÃO TEM DINHEIRO, PARA BLOGUEIROS, PARA PARCEIROS DE AUTORES E EDITORAS OU PARA QUEM USA PDF COMO “TEST-DRIVE”.

Ok, vamos lá.

Eis que, mais uma vez, a polêmica do PDF pirata aparece nas redes sociais, com três times bem definidos: o time dos que defendem, o time dos que são totalmente contra e o time daqueles meio em cima do muro.

Não vou entrar no mérito de qual time eu pertenço. Acho que todo mundo que me conhece já sabe meu posicionamento sobre pirataria. O objetivo aqui é falar sobre os dez piores argumentos utilizados pelo #TeamPDF, ok?

Vamos lá:

DEZ: LIVRO É CARO NO BRASIL

É verdade? É, mas não é ao mesmo tempo. Há livro de tudo quanto é preço aqui. De absurdos R$ 80,00 a loucuras de promoção de R$ 5,00 (ou até menos, já comprei Vaclav & Lena no Submarino por R$ 2,90).

Vou pegar de exemplo o livro “O Diário da Princesa”. Lançado em 2001, o livro em 2003 custava na Saraiva R$ 39,90. Lembro perfeitamente desse valor, pois meu ex-padrasto olhou para mim e disse: “não vou pagar 40 reais em um livro que não é de igreja” quando eu pedi a ele de aniversário de 13 anos. O livro não era mais lançamento na época, mas custava, como a maioria dos livros da Saraiva em 2003, esse valor. O salário mínimo era de R$ 240,00. Ou seja, o livro custava uma grande porcentagem dele.

O mesmo livro hoje em dia, com edição nova e tudo mais, tá custando R$ 30,00 na Saraiva. “Ah, Clara, mas é livro velho” Beleza, os outros livros dela estão custando R$ 40,00, mesmo os mais novos. “Ué, então não faz sentido!! O livro continua caro, tá no mesmo preço de antes!” Sim, mas o salário mínimo já passa de R$ 900,00, né? Há uma grande diferença entre ganhar 240 lulas e ganhar 900 nosferatus, não há? O poder de compra do brasileiro aumentou também, nós sabemos disso. Ou seja, 40 reais em 2003 não são a mesma coisa que 40 reais hoje.

Além disso, há DIVERSAS promoções em tudo quanto é site. Amazon, por exemplo, vive fazendo coisas tipo Amazon Day, vendendo livros de 40 reais por 12, 13, muitas vezes 5 reais (já comprei vários assim). Mesma coisa Submarino, mesma coisa Americanas. E, claro, sempre há o bom e velho sebo e bibliotecas (que, eu sei, nem sempre têm o que a gente quer, mas…).

Ou seja: há editoras que perdem a linha e cobram valores loucos? Claro. 40 paus ainda é dinheiro? Claro. Mas não é tudo assim, tão derrotista. Nem todos custam 40, nem todos permanecem com esse preço depois do lançamento. Nem tudo é assim, tão horroroso.

Outra coisa: há muitos autores nacionais independentes que fazem suas tiragens SOZINHOS e vendem o livro por até 30 reais com frete grátis, ainda por cima (Aretha V. Guedes, Lúcia Lemos, Clara Savelli, etc, etc).

Fora que há um mundo de autores que colocam seus livros de graça na Amazon em vários dias. Não sabia? Então dê uma olhada diariamente aqui, ó: Top 100 Mais Baixados Gratuitamente. Mais barato que um livro de graça, só se o autor te pagasse para ler, não é mesmo?

NOVE: NEM TODO MUNDO TEM CARTÃO DE CRÉDITO PARA COMPRAR NA AMAZON OU NO SUBMARINO

A Amazon já aceita débito. Além disso, conseguir cartão de crédito pré-pago é moleza hoje em dia. Vende em qualquer supermecado grande, tipo o Extra.

O resto dos sites aceita boleto.

Ah, sim: até onde me lembro, não precisa de cartão de crédito para ler livro que o autor colocou de graça na Amazon. Ou seja…

OITO: CULTURA DEVERIA SER GRATUITA

Uai, por quê? Não é porque é arte, que o artista não deva ser recompensado pelo seu trabalho! Se ele quer botar de graça, beleza, mas se é o trabalho dele, por que não deveria ser pago por ele? E o investimento? Capista, revisor, tempo de pesquisa, luz, internet, computador? Como o autor recupera isso tudo?

Quem defende PDF pirata por um acaso chega na porta do cinema ou teatro e grita isso, que cultura deveria ser gratuita? Acho que não, né? Então por que acha que pode fazer isso com literatura? Pagar 100 reais no cinema com a família, beleza, 15 reais em um livro, não?

SETE: PDF AJUDA NA DIVULGAÇÃO DO AUTOR

Ah, sério que esse é o seu argumento? Então você é um santo, está lendo somente para ajudar o autor? Vem cá e me diga: quando termina de ler, você avalia no Skoob? Na Amazon? Faz resenha? Recomenda no Instagram, no Facebook? Se sim, parabéns. Se não, pare, que tá feio.

SEIS: O AUTOR DEVERIA FICAR AGRADECIDO POR ESTAR SENDO LIDO

Claro que ser lido é o foco principal de quem escreve. Se não fosse, a pessoa escreveria em um diário. Mas, desculpa, isso não é motivo para justificar pirataria. A gente fica agradecido por ter nosso trabalho reconhecido, isso sim.

Dizer que a gente tem obrigação de ficar feliz por ser pirateado é ridículo, egoísta e completamente louco. Até porque felicidade não paga a conta de gás nem o tablete da manteiga (que tá um absurdo, né??). É o mesmo que dizer que um professor deveria ficar agradecido por poder dar aulas (mesmo sem receber) ou um médico deveria ficar agradecido por poder fazer operações. Não faz sentido.

Além disso, leitor nenhum tá fazendo favor ao autor quando lê um livro. Literatura é prazer, é entretenimento, é um monte de coisas. O leitor leu porque quis, porque desejava se divertir, ou se emocionar. Repito: você vira pro diretor de um filme e diz: “VI SEU FILME PIRATA, VOCÊ DEVERIA ME AGRADECER POR TER VISTO”? Não, né?

CINCO: O LEITOR QUE LÊ PDF QUIS TANTO LER O LIVRO, QUE DEU UM JEITO DE CONSEGUIR, E ISSO É LOUVÁVEL

Não, louvável seria se o leitor, mesmo duro, juntasse moedas, economizasse no chocolate, na cerveja, comprasse um cartão de crédito pré-pago ou pedisse para o amigo do trabalho comprar no cartão dele, etc. Entrar no LêLivros e baixar livro pirata não é digno de nenhum tipo de orgulho. Qualquer um faz e não dá trabalho algum.

QUATRO: O AUTOR COLOCOU DE GRAÇA NO WATTPAD, MAS AGORA TÁ RECLAMANDO DE PDF

Primeiro: mesmo que o livro esteja de graça no Wattpad, o autor consegue lucrar sim. Quem faz sucesso no Wattpad cria um nome e passa a ter grandes chances de fazer sucesso na Amazon ou mesmo conseguir uma editora. Quantos autores contratados por editoras não vieram de lá? Já ouviu falar na #GeraçãoWattpad?

Ou seja, não é porque o site é gratuito, que o autor não vise receber algo por sua arte.

Segundo: a pessoa tem todo direito de postar no Wattpad de graça e depois tirar e cobrar pelo livro na Amazon. Não é porque o livro um dia foi gratuito, que ele deva ser para sempre. Uma coisa é colocar de livre e espontânea vontade o livro de graça, outra é ser forçado a ver seu livro passando de mão em mão sem ganhar uma moedinha que seja pelo seu trabalho.

TRÊS: NÃO POSSO PAGAR PELO LIVRO AGORA

Gente, e o que o autor tem a ver com isso? Eu também não posso pagar a blusinha do Batman que vi na Renner, nem por isso estou indo lá, botando na bolsa e indo embora sem pagar.

Sério, vivemos em um sistema capitalista. Se você quer um produto, deve comprar esse produto, não levar embora sem pagar. Não há desculpas (salvo, claro, o que eu disse no começo do texto, mas não vou entrar no mérito sobre isso).

Até porque 90% das pessoas que eu conheço que consumem PDF gastam uma graaaana com viagens, festas, salão de beleza, roupas caras, perfumes. Conheço uma, inclusive, que mora em Copacabana, em apartamento próprio. Ok, e não tem 20 nosferatus para pagar em um livro, ou 6 em um e-book?

“AH, MAS O LIVRO QUE EU QUERO É LANÇAMENTO, TÁ 50 REAIS, E AÍ?”

E aí que é problema seu, uai. Tá querendo demais que um lançamento custe barato. Não custa barato em nenhum lugar, com nada! Acorda, gente! Esquadrão Suicida chegou na Americanas custando 40 o DVD, tava 7 um dia desses. Lançamento é lançamento!

DOIS: O AUTOR ADMITIU QUE ESCREVE POR AMOR

Sim, e há professores que dão aula por amor, médicos que cuidam de pacientes por amor, políticos que trabalham por amor. AMAR O QUE VOCÊ FAZ NÃO É SINÔNIMO DE VOTO DE POBREZA.

Eu reviso por amor, mas quero pagar minhas contas, minhas blusinhas do Batman e meus livros, muito obrigada.

UM: ATÉ PARECE QUE QUEM RECLAMA NÃO BAIXA MÚSICA E FILMES, OU TEM WINDOWS PIRATA.

Esse, para mim, é o pior argumento de todos (bem certo que todos são bem ruins).

Primeiro: eu reclamo de PDF e tudo meu é original. Música: Spotify, YouTube ou CDs comprados em brechó. Livros: Kindle Unlimited, promoções, sebos ou parcerias com editoras e autoras, por causa do CJL. Windows e Office: originais. Filmes: Netflix e Locadora. Não coloquem todo mundo no mesmo balaio, por favor.

Segundo: mesmo se a pessoa consumir tudo pirata, só porque ela faz, você pode fazer também? Apontar o erro alheio não diminui o seu. Se o vizinho fura fila, você pode furar também?

“Ah, mas é hipocrisia reclamar do que eu faço”

Pode até ser, mas não muda que você continua fazendo, nééé?

Gente, olha só: eu sei que de vez em quando a situação aperta, a crise bate, o dinheiro some. A manteiga, como citei, tá caríssima, e aqui em casa não estamos nem comprando por enquanto, porque acho um absurdo pagar 10 nosferatus em um tabletinho. Porém, nem por isso estou por aí botando manteigas na bolsa e indo embora sem pagar. Se a crise bateu, nada te dá direito de pegar um livro sem pagar.

“Ah, mas é diferente”

POR QUE É DIFERENTE?

A editora vai lá compra os direitos do livro (e paga tradução, dependendo da nacionalidade do autor), paga revisor, diagramação, capa, impressão, estoque, transporte, paga o editor, o pessoal do marketing, paga a porcentagem do autor, paga sei lá quais impostos sobraram, paga isso, paga aquilo. Aí coloca o preço no livro para cobrir tudo isso e lucrar em cima, mas não recebe o retorno! Ou seja, quando você pirateia, você tá, sim, tirando dinheiro deles. Não se torna uma espécie de furto?

Mesma coisa com o autor independente. Ele vai lá, paga revisor, paga preparação de texto, formatação, diagramação, capista, propaganda no Facebook, coloca o preço no livro para cobrir tudo isso e lucrar em cima. Ou seja, quando é pirateado, ele perde dinheiro de lucro e de investimento, sim. É como se tirassem o dinheiro de sua conta, ué!

Sério, meu maior problema com leitores de PDF nem é exatamente a pirataria em si. Minha maior raiva são as justificativas que, além de ruins, desvalorizam todo o trabalho que dá publicar um livro (não interessa por onde nem por quem).

Admite, gente, que vocês não querem pagar o valor por pura mão-de-vaquice. É mais honesto do que ficar tentando diminuir o trabalho do autor com esse discurso pseudo-socialista, que nada mais é que uma distorção da mesma “filosofia” muito usada por quem bate carteiras e rouba celulares por aí: NÃO POSSO PAGAR, ENTÃO PEGO DOS OUTROS.

(Ah, sim, antes de se ofender por ser comparado a um ladrão, pense se tirar o dinheiro do autor não é mais sério do que as minhas palavras. Sei lá, eu acho um cadinho, mas beleza.)

LIVRO É TRABALHO, CUSTA DINHEIRO, MERCADO EDITORIAL É MERCADO. Não dá para botar no balaio mágico da arte free, porque quem faz arte também precisa comer.

Antes que alguém me ataque trazendo a bandeira do “e as pessoas pobres?”:

Já disse que cada caso é um caso, e que esse texto NÃO INCLUI ESSES LEITORES. Há quem realmente não possa pagar, há quem more nos cafundós de Judas e não tenha biblioteca ou a Amazon não chegue (ok, mas tem internet e lê PDF, então pode comprar o e-book, né?), há isso, há aquilo.

MAAAAS também há quem faça viagens internacionais todo ano, mas continue consumindo PDF, mesmo se o livro custe 6 reais na Amazon, ou 5 reais no sebo. E essa crítica toda é, como já disse, direcionada para esse povo espertalhão.

Como eu disse já e repito: quer ler? Leia, problema seu. Mas não tente subestimar nossa inteligência com esses argumentos doidos, por favor.

O buraco é bem mais em cima nos bastidores, pessoal.

Por Clara Taveira

OBS: Esse post foi inicialmente postado no Medium, e foi retuitado por ninguém menos que Babi Dewet e Thalita Rebouças. Alguém me levanta, que eu tô no chão!



Um comentário:

  1. Hey, amei o texto! :) Conheci o blog há alguns minutos e passeei por alguns posts já.

    Quanto a discussão em si, acho que não é muito bom a gente entrar na discussao do "salário mínimo é 900 reais, antes era 200", haha. Porque da mesma forma, em 2003 transporte custava 0,50 centavos, a própria manteiga, como você citou, está à preço de ouro, e hoje o aluguel de uma casa (que tem sido meu problema) não custa menos que 500 reais mesmo no beco mais profundo da favela hahaha

    Então, é, o salário ter aumentado não significa muita coisa.

    Por outro lado, eu identifico em alguns sites de distribuição de ebooks um discurso de que sao semelhantes as biblioteca (que, inclusive, frequento muito!). E é uma coisa que eu realmente sugiro a outros autores... Se eles se preocupam com leitores que não podem pagar por livro, por que não doar 1 ou 2 exemplares para as principais bibliotecas da cidade, e avisar isso aos leitores interessados? ^-^ Acho que é uma boa ideia pra gente movimentar esses espaços tão ricos em cultura.

    Sim, nem todo mundo vai à biblioteca e tem gente que só baixa ebook por desvalorizar a cultura. Mas também tem quem vá à biblioteca por falta de dinheiro, e a gente não pode virar pra ela e CONTINUAR replicando esse discurso que "se não tem dinheiro, não lê", porque ele é meio cruel XD Ler não deveria ser uma regalia, um hobbie de luxo.

    Enfim, espero que consigamos encontrar uma solução que não prejudique os autores financeiramente, que construa uma realidade ideal de profissão para eles no cenário brasileiro, mas também não exclua os leitores de baixa renda (como eu e como tantos outros).

    Abraço!

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